Uma cidade grande revela suas estranhezas
à medida que resolvemos conhecê-la. Ela se desvenda aos poucos para seus
moradores e visitantes, especialmente quando a gente se aventura pelos seus arredores,
entre uma esquina e outra. Para que estas revelações se apresentem, é bom prestar
atenção aos detalhes e não se distrair com pensamentos devaneantes. Essa
exploração da metrópole nem sempre é espontânea. Às vezes pode ser um evento ou
uma reunião de trabalho que nos leva a sair do roteiro conhecido. E...lá vamos
nós!

Pegar o caminho da esquerda ou da
direita? O que foi mesmo que a voz falou? Não entendi a orientação! Resultado:
desespero! Discuto com o equipamento, mas ele não entende e não responde às
blasfemações. São os novos companheiros da vida moderna. Com quem brigamos e debatemos.
Mas, nem adianta fazer beicinho ou choramingar, pois trata-se de um equipamento
frio e calculista.
Na aventura urbana, rodamos por
avenidas esburacadas e ondulantes. Disputamos espaços com ônibus que parecem
enormes centopeias a sacolejar. E, quando pensamos estar próximos do ponto de
chegada, somos surpreendidos por uma rua sem saída, ornamentada por ipês roxos
e sacos de lixo.
A pressa e a ansiedade precisam
ser controladas para permitir a manobra na ruela estreita que nos colocará de
novo no curso desejado. Essencial é encontrar a saída do labirinto, mesmo se as
ruas estiverem escuras e que ladeiras íngremes se descortinem à nossa frente.
Se nos sentimos perdidos e a fala
do GPS é incompreensível, o jeito ainda é apelar para um cidadão no ponto de
ônibus, para um motorista de táxi ou para o motoboy. Nada como o jeitinho tradicional para
conquistarmos o alvo, chegar ao destino. Nenhuma pedra irá se interpor ao
objetivo, mesmo que seja uma daquelas enormes que sinalizam perigosos buracos
no asfalto.
Hoje, subi a avenida Rebouças,
que fica praticamente intransitável no horário de pico, depois do túnel que foi
construído no cruzamento com a Faria Lima. Lojas decadentes de ambos os lados do caminho
e insistentes faixas de “Aluga-se” nas fachadas dos imóveis que se sucedem à
medida que desviamos o olhar para a paisagem.
Aliás, por que será que a concessionária de automóveis fechou? E por que
a loja de móveis também cerrou as portas? Parece que estão nascendo quarteirões-fantasma.
Preciso encontrar a Rua Cristiano
Viana. Vou virar levemente à esquerda daqui a pouco, como disse o GPS, e espero
não me perder em nenhuma encruzilhada. Mesmo sem saber ao certo o rumo e apesar
do atraso, vou seguindo. Mas, tem um outro obstáculo: a chuva torrencial que
atrapalha a visão. É quase como se eu dirigisse às cegas. Reduzo a velocidade, uma
vontade de parar me domina. Não dá para ler as placas nos postes. E o GPS
continua com suas orientações. Enfim, decido desligá-lo. Devo continuar
seguindo em frente? Digo para mim mesma, mas não escuto uma resposta.
Assusto-me com um jato de água
que um outro veículo atirou em meu para-brisa. Poças! A chuva ficou mais fina.
No ponto de ônibus, as pessoas se parecem com cachorros molhados. Semblantes
tristes por causa da roupa úmida e dos transportes lotados. Disfarço meu olhar
e decido voltar a ouvir o GPS. Hora de virar finalmente à esquerda para o
retorno. Talvez seja tarde demais para o compromisso agendado. Mas, sem sofrimento. Espero que a outra pessoa
também tenha aguentado o aguaceiro e o trânsito. Vou saber daqui a pouco.
Faltam apenas 100 metros para o endereço, diz o GPS. Avanço centímetro a
centímetro para não passar do local. Finalmente,
eu cheguei ao destino, querido companheiro. Converso com você na volta!
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