Crônica: Praça perdida

Crônica: Praça perdida

Há algumas décadas, ali existia um terreno baldio, habitado por ratos e outras pragas urbanas. Pessoas teimavam em jogar lixo naquele lugar e outros entulhos, como tábuas e vasos sanitários. Uma visão que entristecia os moradores que residiam em casas simples, sem pintura ou portão de alumínio, numa rua de terra batida e um pouco de cascalho.
Os sapatos ganhavam aquela cor avermelhada em dias de sol ou enlameavam-se depois das chuvas, quase como se ali fosse o sertão e não um bairro na periferia de São Paulo. Quantas pessoas não escorregaram e rolaram no chão molhado? Bastava algumas horinhas de água fina vinda do céu para o solo se transformar numa barra de sabão.  Ainda bem que as filmadoras portáteis e os celulares com câmeras, que tudo registram e transformam em hits nas redes sociais e programas de TV, eram apenas sonhos de inventores naquela época.

Um certo dia – não lembro exatamente qual – aquele terreno ganhou a visita de funcionários da Prefeitura, enviados pela Secretaria de Áreas Verdes ou qualquer outro nome parecido. E o que os moradores menos esperavam aconteceu: sumiu a imundície e nasceu uma praça. Era pequena. Pouco mais de 250m², mas quem se importava com o tamanho? Arrancaram os matos, plantaram mudas de árvores, cercaram com muros baixos de pedra e construíram bancos nos três lados da pracinha. O terreno era meio triangular, mas quem se importava com o formato?
Naquela praça as árvores cresceram. Sei bem que existe um abacateiro, que eu reconheço pelo formato das folhas e frutos. Especialista em plantas que eu não sou, vejo outras pequenas árvores de menor porte e moitas. De vez em quando, a administração regional envia funcionários para carpir e podar – muito raramente, diga-se de passagem.
Quem até hoje mantém aquela praça um pouco mais ajeitada é o Sr. Valdir, um aposentado que mora nas redondezas. O dono do bar logo em frente gosta de dar milho às pombas que povoam a região. Toda manhã lá está ele em sua missão, cercado de aves famintas. Cães abandonados fazem sua morada naquele pedacinho de chão e contam com a boa vontade dos moradores. Alguém lançou sementes de abóbora e, agora, ramas se esparramam pelo solo e flores alaranjadas são vistas entre o verde.
Aquela praça perdida na periferia de São Paulo virou assunto de TV quando ali foi baleado um traficante, numa briga entre gangues. Pois é…Nos últimos anos o local se transformou em área de lazer de marginais e usuários de drogas, que se assentam ali na parte da tarde, normalmente. Eles param seus carros, motos, bicicletas ou chegam a pé. Se reúnem em grupos de 3 a 4 pessoas, enrolam o baseado e curtem a maresia.  Jovens que integram a geração nem-nem: nem estudam, nem trabalham e nem querem uma vida “normal”, com trabalho, obrigações e uma família.

As pessoas passam por ali de cabeça baixa e olham para qualquer lado, menos na direção da praça e de seus ocupantes. Receio de encarar a realidade e de verem ali uma vizinha ou um filho? Os policiais também transitam na região. Param suas viaturas, revistam, prendem, mas até agora não conseguiram fazer uma nova limpeza naquele terreno. Só torcemos para que a situação mude e que possamos ver aquela diminuta praça florescer algum dia.

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